Geografia do Rio e o Campeonato Carioca de Futebol: do interior à capital, uma forma divertida de torcer e aprender.

O Campeonato Carioca, um dos estaduais mais tradicionais do país, divide opiniões. Tem o time dos defensores, os fanáticos pelos clubes de menor investimento, tem a galera que ama um clássico e tem, é claro, os que “cornetam” (usando a linguagem do futebol) a competição – seja pelo formato, calendário ou pela falta de investimento, por exemplo. O fato é que independente da sua leitura sobre o torneio, um consenso pode ser estabelecido: o Carioca faz parte da cultura do Rio. Para além da prática esportiva e das discussões técnicas, trata-se de uma ótima ferramenta de conhecimento sobre a cidade e o estado.

Pensando nesse potencial didático, usamos a localização dos times que disputam a Série A do Carioca para sugerir uma aula sobre a geografia do Rio de Janeiro, apresentando, por exemplo, a diversidade do estado, que conta com morros, praias, cachoeiras, serras e outras tantas riquezas naturais, passando pelo seu relevo e hidrografia. De carona nesse gancho, é possível usar a história do Boavista para apresentar a cidade de Saquarema, situando que trata-se de uma cidade da Região dos Lagos do estado, conhecida por praias paradisíacas e por uma relação estreita com outros esportes além do futebol: é a casa do Mundial de Surfe e também da Confederação Brasileira de Vôlei.

Ainda aproveitando o gancho do Boavista, o Verdão de Saquarema, imagina apresentar a divisão geográfica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, a partir da cidade? Desde 2017 o IBGE extinguiu as messoregiões e microrregiões, criando um novo quadro regional brasileiro, que são as regiões geográficas intermediárias e imediatas. Por definição, as intermediárias representam agrupamentos de municípios que têm como principal referência a rede urbana e possuem um centro urbano local como base; enquanto as imediatas são articuladas através da influência de uma metrópolecapital regional ou centro urbano representativo dentro do conjunto. Neste sentido, Saquarema está na região imediata do Rio de Janeiro, que por sua vez, é uma das 509 regiões imediatas do Brasil.

Para Adriano da Silva, professor de Geografia da Educação Básica, essa é uma forma criativa de apresentar um conteúdo tido por muitos educandos como “quadrado ou distante da realidade”.

“Utilizar o Campeonato Carioca para apresentar a geografia do estado do Rio de Janeiro é uma ferramenta de grande valor didático, já que muitos estudantes são apaixonados pelos seus clubes, de diferentes cidades do estado, e pelo futebol.”

Seguindo a metodologia, podemos estudar também rios importantes que passam pelo estado. Que tal “vestir a camisa” do Resende para falar da hidrografia da cidade homônima? Resende fica às margens do Rio Paraíba do Sul, o mais importante do nosso estado e que banha também São Paulo e Minas, no que chamamos de região sócio-econômica do Vale do Paraíba. Há também uma relação entre o time e o relevo da cidade: o Resende é conhecido como “Gigante do Vale”, justamente por estar localizado num local predominantemente de vales. Por definição geográfica, vales são áreas de baixa altitude cercadas por áreas mais altas, como montanhas ou colinas. Geralmente são formados pela atividade fluvial, onde a ação da água corrente causa a erosão do terreno.

Essa relação dos clubes com as cidades também pode fortalecer o senso de pertencimento da população e dar projeção às cidades do interior que, de modo geral, recebem menos atenção do que as da capital e região metropolitana do estado. Para o ex-atleta e professor de Educação Física Bruno Leal, o futebol pode ser um eficiente “cartão de visitas”.

“Embora tenham menos holofote, os clubes do interior do estado são muito tradicionais, contam com uma torcida fiel e estão na memória afetiva de muitas pessoas. Sendo assim, jogos e torneios, especialmente um Estadual, podem ser atrativos para fomentar o turismo, gerar renda e movimentar a agenda de Esporte e Lazer da cidade. Além disso, há de se considerar a prática esportiva: são escolas importantes de formação de atletas e vitrine para os que almejam trilhar o caminho profissional. É super possível – e atrativo – usar a potência do futebol do Rio para mostrar novos cenários para além da região metropolitana”.

A verdade é que as possibilidades de abordagem do tema são infinitas. Quando falamos, por exemplo, dos times da capital é possível ilustrar as regiões da cidade a partir das sedes dos clubes. Assim, na tabela da Série A o Vasco representa a Zona Central; Flamengo, Fluminense e Botafogo estão na Zona Sul; Madureira e Portuguesa ficam na Zona Norte – a segunda na subdivisão da Ilha do Governador; enquanto o Bangu é o clube da Zona Oeste. Além disso, é claro, podemos ainda relacionar o Carioca com outras áreas de conhecimento, nos aproximando da linguagem e da rotina dos educandos e dos seus familiares.

O futebol do Rio, que vai de multicampeões a clubes mais modestos, também passeia de praias à serra, construindo saberes que vão além dos gramados e, quem sabe, formando apaixonados por futebol e geografia.